quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Heartbreaker

- Você tem que assumir que acabou!
Foi dizendo essa frase que descobri de onde vêm todo meu apego e minha melancolia. Não os momentâneos, mas os característicos. Intrínsecos a mim desde não sei quando. Ou talvez agora saiba.
Estava na cama de minha mãe, lendo um texto para a faculdade. Ela entra e começa a arrumar umas coisas no armário. Digo: "Sábado vou pra casa do Matheus". O espanto só não foi maior pois eu já a havia avisado que queria sair de casa. Mas não deixou de ser afiado. Tanto que me sinto perfurado de alguma forma.

Porque, como, será, e o dinheiro, como é lá, os meninos num são doidões não, você vai perder seu conforto, e eu?... perguntas não tão interrogativas foram feitas e respondidas frigidamente. Não foi tão dificil, já que tinha a forte determinação como escudo a qualquer tipo de sentimentalismo.
Ela começou a chorar, de supetão, logo depois de se deitar do meu lado abraçada à almofadinha. Soluçou e imediatamente se virou, com vergonha das lágrimas, acho. Com vergonha de demonstrar tanta fraqueza perante minha máscara de força.
- Fico achando que você vai embora pelo que está acontecendo. Fico achando que a culpa é minha.
A culpa não é sua, mãe. Ninguém tem culpa, tendo em vista que todos têm. E minha vontade de ir embora é antiga. Os últimos capítulos da nossa novela familiar deram apenas uma boa oportunidade.

Não chorou por muito tempo. Eu não deixei. E não porque a confortei com abraços, beijos e cafunés. Mas com frieza, sem derramar uma lágrima nem trocar um toque sequer. Talvez tenha sido pior que um tapa bem forte no rosto. Mas enquano chorava, mostrou toda aquela tristeza inútil e repetitiva, de quem se apegou a um cadáver em putrefação que, além de memórias, nada mais tem de bom a oferecer.
- Você tem que assumir que acabou!
- Tenho, né, filho? Acabou, né? Tá certo.
Essa frase iniciou o epílogo das lágrimas. Tornaram-se soluços e mais algumas frases tristes que, em alguns momentos, transformaram-se em minha mãe em pé, indo ao banheiro lavar o rosto e se preparando para sair. Não tão forte e segura de si, mas melhor do que estava antes.

Sou um necrófilo. Me apego demais e acabo segurando zumbis por mais tempo que deveria.
Não tenho o mínimo orgulho disso. Tenho raiva de outros necrófilos. E talvez o "tapa bem forte no rosto" seja minha maneira de salvá-los de si próprios e aprender, aos poucos, a estapear meu próprio rosto.

Descobri de onde vêm o apego e a melancolia. Dela. Qualidades em certos momentos. Defeitos corrosivos atualmente. E acho que só eu posso me salvar.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Bons budistas não dão bons artistas

Alguns amigos meus são (ou serão) grandes artistas. Há algo de nato neles, como se a expressividade do que falam ou fazem fosse mais fluida, menos enviezada. Esses mesmos amigos são os mais instintivos, no bom e no mal sentido. De duas uma: ou seu auto-conhecimento é pobre ou o auto-controle que é fraco. São sempre pessoas com um que de descontrole, daquelas que você nunca diria: "como é calmo esse sujeito".

E acho que artistas precisam ter isso mesmo. Esse descontrole. A música do músico, o quadro do pintor, a escultura, o livro, as obras em si não podem ser gestadas com rédea curta. O controle total do criador geraria um texto de auto-ajuda, empresarial, mercadológico, mas nunca belo, no sentido mais "artístico" do termo, embora eu tenha minhas dúvidas quando a um conceito/consenso do que seria a "Arte". O legal da "arte" está nessa expressão íntima do autor. Nessa sinceridade que pode ser percebida de alguma forma. Se "arte" é alguma coisa, acho que deve ter a ver com isso. Matemática nunca será arte. Fractal de cu é rola. Se é pra ser racional faça um teorema e não uma poesia.

Eu, nos meus eternos conflitos intra-pessoais, racionalismos, pensamentos analíticos demais, não creio ter muito talento pra ser artista. Mas talvez eu consiga balancear o lado direito com o esquerdo do cérebro e me fazer mestiço.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Escola da vida

Matéria do dia:

Aprendendo a descontar sua raiva nos outros:

> Tópico 1: dosagens
> Tópico 2: sentir-se tranquilo no durante e depois
> Tópico 3: falta de controle ou descarrego?
> Tópico final: você tem vocação para forninho?

valor: 100 malditos pontos

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Eu, eu mesmo e Charlie

Certo dia o Otto estava muito nervoso e saiu da coleira. Ele sempre foi meio serelepe, mas naquele dia estava hiperbólico. Acho que a fome deve tê-lo deixado agitado...
Como de costume gritei o Clark. Ele já estava correndo atrás do Otto há muito tempo. Sempre eficiente esse Clark....ou quase. O problema é que ele nunca foi muito rápido, então o Otto acaba conseguindo arrumar alguma encrenca.
Ops! Perdão... que indelicadeza a minha. Otto e Clark são, respectivamente, meu ID e meu Superego. Amigos inseparáveis e eternos companheiros de todas as atividades. O Otto me acompanha desde que nasci. O Clark chegou depois, meio tímido, não falava muito. Depois se soltou. Hoje faz até piada, acredita?
Claro que nem tudo são flores. Otto e Clark são um tanto quanto... diferentes. Sempre brigam. Qualquer assunto é motivo para discordarem e trocarem alguns tabefes, mas tudo sempre acabou bem. As coisas ficaram realmente preocupantes quando nasceu o Charlie. Eu devia ter, sei lá, uns 13 anos, quando o Clark foi atacado. Não sei direito pelo quê, mas tinha cheiro de estrogênio. Deixaram o menino pro Clark cuidar. Coitado. 'Superegoso' como é não conseguiu negar a responsabilidade. O fato é que, depois de um tempo, o moleque cresceu.... e começou a fazer bagunça. Uma criança travessa, um adolescente rebelde e um adulto rabugento. 'Pior que isso só dois disso', já dizia Descartes.
Charlie herdou o que Clark sempre teve de pior: o criticismo. A falta do que fazer deve tê-lo deixado assim. O prazer supremo para ele é me podar. E não podar os galhos podres (desses o Clark sempre deu conta), mas os viçosos, que dariam os melhores frutos. Se por exemplo eu penso em fazer um curso de desenho muito legal, que vai me acrescentar muito, ele logo vem desestimulando: "Ei, panaca! Seu pai não vai dar a grana e você sabe disso. Pára de ficar querendo bobagem". Bom pai que é, o Clark raras vezes reprime Charlie, e o Otto, coitado, mal percebe o que se passa (normalmente fica no canto roendo algum objeto apetitoso... como a hipófise, talvez...). Se tentasse, provavelmente meu pai pagaria o curso sem reclamar (muito) e não se arrependeria. Mas o Charlie é muito persuasivo. Os argumentos dele sempre são dotados de uma maldita lógica incontestável.
Tem uma moça na festinha. Linda. Cabelos pretos. Doida comigo:
_ "Pensa bem mané. Se ela te der um fora a amizade de vocês vai pro saco. Você quer isso, quer?"
_ Mas Charlie... as minhas chances são de 97,3%. É muito difícil de eu tomar um fora.
_ "Sim, eu sei. Mas e SE ela te der um fora?! A chance é pequena, mas existe..."
_ É, talvez você tenha razão...............

Entende o que eu digo?
Só consigo fazer o que realmente quero se manipular o Clark. O Otto me ajuda com piruetas e umas carinhas de dó. Embebedar o Clark costuma funcionar também.
Se eu já tentei me livrar do Charlie? Claro. O problema é que, não importa o que eu faça... o maldito sempre volta depois de uns dois ou três minutos. Uma vez empurrei ele no Abismo (aquele buraco negro que todo mundo tem perto do pâncreas e que alguns chamam de Baço) e mesmo assim ele voltou. E voltou nervoso. Me xingou e aprontou um escândalo. O insistente sobreviveu até ao Grande Porre de 2005. Depois daquele dia acho que perdi um pouco das esperanças de eliminá-lo.
Crianças têm amigos imaginários. O meu é um inimigo. Ruim sem ele. Pior....muito pior com ele.
Um dia eu ainda tento morfina...

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Caderno de piadinhas - 1

A mulher teve trigêmeos. O pai, surpreso, sem saber o que dizer, exclamou: oba!
Aí, ela engravidou novamente e teve outros trigêmeos.
O cara então desabafou: Oh Deus, tudo menos dízima periódica.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

- Como foi seu carnaval em BH? - disse a pequena moça

O corpo jogado ao chão treme um pouco e um braço cambaleia. A respiração volta; pesada e difícil, como se o ar fosse agora feito de chumbo derretido. Ele tenta falar:
- eur oderr... ohr... carrhnavrrhhl....
- O que?! - exclama, assustada, a pequena moça.
- eur oderr... ohr... carrhnavrrhhl........
Cada palavra estuprava as cordas vocais do homem, que desiste de tentar falar e simplesmente batuca do chão, tentando mostrar o máximo de raiva que conseguia:
- Ah, entendi! Carnaval ruim, né?
O homem levanta com dificuldade uma das pálpebras e, acompanhado a uma tentativa de soslaio, mostra seu dedo do meio. O que sobrara de seu corpo então cai e começa, enfim, a se decompor confortavelmente...

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Kiss me, stupid

"Ontem ela bateu na minha porta por 45 minutos... mas eu não a deixei sair"

Dino (Dean Martin), em Beija-me, idiota, 1964. Dirigido por Billy Wilder.Vale a pena. =)

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Dicionário do Rei

Poesia: clichê travestido como coisa nova.

Back to the future - Part 3 (1990)

Ele entra no saloon, arrastando a alma como se fosse um barril de pólvora. Aproxima-se do velho balcão onde costuma se apoiar. O bartender solidariza-se:
- Emmet! What can i get to ya? The usual?
- No, Chester, im gonna need something a lot stronger than that tonight.
- Salseparilla.
- Whisky, Chester.
- Whisky? Emmet, are you sure? You know what happened to you on the fourth july.
- Whisky.
- Ok. I ain't your papa. Just dont wanna see you doing the wrong thing.
O copo-dose é totalmente preenchido.
- Leave the bottle! - diz Emmet.
Um senhor bem vestido, que segura um pedaço de arame, observava tudo atencioso.
- Its a woman? Right?
Emmet pára o copo perto da boca, antes de beber, e o retorna ao balcão. Seu rosto entristece ainda mais.
- I knew it. I have seen that look on a man's face a thounsand times... all across the country. What i can tell you, friend: you'll get over her.
- Clara is one in a million. One in a Billion. One in a googolplex*. The woman of my dreams and i lost her for all the time.
- I can assure you sr., there are other women. I have peddling this barbedwire all across the country. This taught me one thing, certain: Is that you never know what the future might bring.
- Oh, the future. I can tell you about the future.

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Pra quem não entendeu o original em inglês:

Ele entra no saloon, arrastando a alma como se fosse um barril de pólvora. Aproxima-se do velho balcão onde costuma se apoiar. O bartender solidariza-se:
- Emmet! O que vai querer? O de sempre?
- Não, Chester, vou precisar de algo bem mais forte essa noite.
- Salsaparilha.
- Uísque, Chester.
- Uísque? Emmet, tem certeza? Você sabe o que te aconteceu no quatro de julho.
- Uísque.
- Ok. Eu não sou seu pai. Só não quero vê-lo fazer besteira.
O copo-dose é totalmente preenchido.
- Deixe a garrafa! - diz Emmet.
Um senhor bem vestido, que segura um pedaço de arame, observava tudo atencioso.
- É uma mulher, não é?
Emmet pára o copo perto da boca, antes de beber, e o retorna ao balcão. Seu rosto entristece ainda mais.
- Eu sabia. Já vi essa expressão no rosto de um homem mais de mil vezes... no país todo. O que eu posso dizer, amigo: você vai esquecê-la.
- Clara é uma em um milhão. Uma em um bilhão. Uma em um googolplex*. A mulher dos meus sonhos e eu a perdi para sempre.
- Eu posso lhe garantir, senhor, há outras mulheres. Vender esse arame através do país me ensinou uma coisa certa: você nunca sabe o que o futuro trará.
- Oh, o futuro. Eu posso lhe falar do futuro.

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*googolplex: Na matemática, um googol é o nome do número 10-100 (1 seguido de 100 zeros). Um googolplex é ainda maior: 1 seguido de uma quantidade de zeros igual a googol (a 1 with a googol zeros).

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Censurado

É o super-ego sendo sensato, já que eu não sou...

José

Não gosto de postar escritos inteiros de outros aqui, mas abro uma excessão para esta passagem que vale muitíssimo a pena ser lida.
Trecho de As Pequenas Memórias, de José Saramago. A título de divulgação.

"Cai a chuva, o vento desmancha as árvores desfolhadas, e dos tempos passados vem uma imagem, a de um homem alto e magro, velho, agora que está mais perto, por um carreiro alagado. Traz um cajado no ombro, um capote enlameado e antigo, e por ele escorrem todas as águas do céu. À frente caminham os porcos, de cabeça baixa, rasando o chão com o focinho. O homem que assim se aproxima, vago entre as cordas de chuva, é o meu avô. Vem cansado, o velho. Arrasta consigo setenta anos de vida difícil, de privações, de ignorância. E no entanto é um homem sábio, calado, que só abre a boca para dizer o indispensável. Fala tão pouco que todos nos calamos para ouvir quando no rosto se lhe acende algo como uma luz de aviso. Tem uma maneira estranha de olhar para longe, mesmo que esse longe seja apenas a parede que tem na frente. A sua cara parece ter sido talhada a enxó, fixa mas expressiva, e os olhos, pequenos e agudos, brilham de vez em quando como se alguma coisa em que estivesse a pensar tivesse sido definitivamente compreendida. É um homem como tantos outros nesta terra, neste mundo, talvez um Einstein esmagado sob uma montanha de impossíveis, um filósofo, um grande escritor analfabeto. Alguma coisa seria que não pôde ser nunca. Recordo aquelas noites mornas de Verão, quando dormíamos debaixo da figueira grande, ouço-o falar da vida que teve, da Estrada de Santiago que sobre as nossas cabeças resplandecia, do gado que criava, das histórias e lendas da sua infância distante. Adormecíamos tarde, bem enrolados nas mantas por causa do fresco da madrugada. Mas a imagem que não me larga nesta hora de melancolia é a do velho que avança sob a chuva, obstinado, silencioso, como quem crumpe um destino que nada poderá modificar. A não ser a morte. Este velho, que quase toco com a mão, não sabe como irá morrer. Ainda não sabe que poucos dias antes do seu último dia terá pressentimento de que o fim chegou, e irá, de árvore em árvore do seu quintal, abraçar os troncos, despedir-se deles, das sombras amigas, dos frutos que não voltará a comer. Poque terá chegado a grande sombra, enquanto a memória não ressuscitar no caminho alagado ou sob o côncavo do céu e a eterna interrogação dos astros. Que palavra dirá então?"

(J. Saramago)

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Biologia de buteco

Alergia: sistema imunológico mimado dando piti.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Escamas

O chão do meu quarto está, há uns dois meses, com um problema sério de cera. Ela está descolando como nunca. Múltiplas lasquinhas grudam no meu pé, no chinelo, nos móveis, no lençol e dão a impressão de sujeira, mesmo logo depois do quarto ter sido limpado. Talvez o problema seja da própria cera, mas acho que o culpado é o tempo. Algum dia todos temos que trocar de pele. Mudamos por dentro e a carapaça já não é morfologicamente adequada às nossas novas formas. Acho que foi por isso que hoje, ao acordar, olhei com simpatia para meu chão. A raiva de antes se tornou identificação. Acabei entendendo-o. E se o processo é demorado, não é mais que normal. Mudar é difícil. Muito difícil. E eu e meu chão estamos passando por uma de nossas fases mais árduas nesse sentido. Descascando e soltando a pele velha. Deixando-a cair e mostrando, aos poucos, a nova. Mutando em vários aspectos e nos tornando melhores, de certo.
Pensando bem, ele estava descascando muito mais quando começou. Sinal de que o processo está em andamento e talvez chegando num fim. O que será que vai se tornar depois? No que irei me (re)fazer? Eu só posso esperar. E esperar. E esperar. E esperar que as próximas mudanças sejam mais fáceis... e menos sujas.

Tell everybody you know...

Hoje teve show dos prisioneiros. Algo que não experimentávamos há tempos.
Só pelo prazer de tocar já foi ótimo. Mas o melhor foi lembrar de uma coisa importantíssima:

Só o Rock'n Roll salva!

E hóstia é o caralho. Eu quero é cerveja, poha!